quinta-feira, 30 de outubro de 2014

A oculta disputa musical entre Dilma e Aécio



Nos últimos meses vivemos um tempo onde a distância entre a política e o povo foi diminuída ao máximo. A última disputa presidencial tocou o povo como nunca, o que resultou em uma campanha política empolgante, emocionante e até mesmo propícia a perdas de amizades que já duravam anos e a brigas entre familiares. O clima de ataque saiu dos horários eleitorais e debates televisivos e foi parar nas redes sociais, nos sofás, nos restaurantes... Em todos os lugares se discutia política. Com isso ganhou o brasileiro, que aos poucos vai se politizando e se tornando um ser crítico diante de um quadro político conservador que ainda temos. 

Aliás, nos próximos quatro anos o nosso congresso, nunca será tão conservador desde a ditadura. Mas como pode crescer o olhar crítico do eleitor e o congresso eleito ser mais conservador que o anterior? Bom, isso daria uma ótima análise política, mas não a farei, já que os objetivo principais desse blog são música e poesia. O que posso dizer, superficialmente, é que o aumento do nível crítico do eleitorado não necessariamente significa que sejam sempre críticas progressistas. 

Mas se esse blog trata sobre música e poesia, por que este artigo vem abordar a questão política da última eleição no Brasil? O objetivo deste artigo é destrinchar um marketing oculto, mas não menos importante na última campanha eleitoral para presidente do Brasil: o contexto musical de campanha. Todos sabem a força do marketing político e como são importantes os bastidores deste em todas as campanhas políticas. Entre discursos, posições, ideais, posturas, alianças e tantos outros fatores que abrangem o marketing político, o contexto musical passa, muitas vezes, despercebido. Não estou dizendo que nunca ninguém aprende o jingle do seu candidato, isso faz parte do marketing, o que quero dizer é que muitos aprendem e não sabem a dimensão e importância desse jingle na decisão final da eleição. 

Quando falo em "contexto musical" quero dizer que esse marketing musical não se limita aos jingles dos candidatos, há toda uma estrutura montada para a conquista do público alvo e, consequentemente, de votos. Uma prova disso são as alianças entre os principais presidenciáveis e artistas, onde muitos músicos declararam votos e cantam juntos pelo seu candidato escolhido. É bom deixar registrado que estamos tratando de marketing, sendo assim, são muitas as técnicas utilizadas para que a ação seja satisfatória e eficaz, obtendo o êxito no final. Já conhecida no campo empresarial, a técnica de utilização da imagem de artistas famosos para atingir determinado público alvo foi muito utilizada pelos presidenciáveis, na recente campanha eleitoral.

Nesta última corrida presidencial, nós podemos acompanhar o tanto de músicos que apoiaram os principais candidatos e nossa análise será baseada nesse ocorrido. Podemos observar, desde o início da campanha, que a utilização da imagem dos artistas, por cada candidato, ocorreram de tal maneira a atingir um determinado público necessário para angariar o maior número de votos. Não quero dizer com este artigo que todos os artistas apoiaram determinado candidato(a) por interesses publicitários ou somente para ganhar mercado, o que faço é analisar como as imagens destes foram utilizadas pelo marketing político das campanhas. 

Para que seja feita essa rápida análise, faço questão de lembrar o pensador francês Pierre Boudieu, autor do livro "A distinção". Neste livro, o autor faz uma análise crítica sobre a separação de culturas, o que ele vai chamar de cultura legítima e cultura popular. Em suas explanações, Bourdieu vai detalhar como ocorre essa divisão e como ela é perpetuada e mantida na sociedade. O autor esmiúça as estratificações sociais e analisa os gostos destas. Ao final, é possível perceber que classes sociais, nível de instrução, modos de vida, entre outras classificações, são fatores decisivos no gosto cultural das pessoas. Bourdieu retrata a codificação da "cultura legítima", ou seja, é como se fosse necessário um código para que você tivesse acesso a ela, e esse era um método utilizado pelas classes mais altas para se separar, culturalmente, das classes mais baixas. Ou seja, se você não é nobre, escuta determinado tipo de música, mas se você é nobre, vale o nobless oblige: se comporte como um e aprecie a "cultura legítima".

Pode não parecer, mas isso ajuda a detalhar o marketing político utilizado pelas campanhas. A candidata Marina Silva, contou com apoios de músicos renomados da MPB como Gilberto Gil e Caetano Veloso. Se analisarmos mais criticamente, o uso da imagem destes artistas serviu para passar confiança em um projeto político que se auto-intitulava como "a nova política". Marina tentava de todas as formas a fuga de uma polarização política (PT x PSDB), por isso buscava votos em todas as camadas sociais, já que segundo pesquisas as classes mais baixas estavam com Dilma, enquanto as mais altas com Aécio. Gilberto Gil e Caetano Veloso, são músicos consagrados, eternizados na nossa cultura popular brasileira, sem falar que são taxados como músicos que tocam para um público mais seleto. Ótimas personalidades para passar confiança em um projeto político que se auto-identificava como "novo".

Passando para o segundo turno a luta ficou maior. De novo se viu de um lado o Partido dos Trabalhadores (PT), do outro o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). É muito melhor ir para uma guerra quando se conhece o inimigo, e isso é válido para os dois partidos. Há doze anos na presidência da república, o PT ficou marcado por suas políticas sociais que tiraram milhares pessoas da miséria no Brasil, que incluíram milhares de pessoas na educação superior, no ensino técnico e gerou empregos como nunca antes se tinha gerado neste país. Sendo assim, seu marketing foi previsível, investiu pesado na imagem do PT como "o governo da inclusão social".

Os músicos que apoiaram a campanha de Dilma Rousseff, vinham de muitos gêneros musicais: samba, rap, MPB, samba de roda baiano, funk. Artistas como Beth Carvalho, Elza Soares, Alcione, Chico César, Zeca Baleiro, os fankeiros do "passinho", Lirinha (Cordel do Fogo Encantado), entre muitos outros, serviram para comunicar ao Brasil que aquela era a candidata da inclusão, do não aos preconceitos, da interação cultural. Chico Buarque, nas últimas semanas, pediu votos para Dilma, inclusive com propaganda na televisão só para a sua petição. Chico Buarque é um cantor e compositor consagrado na MPB, inclusive com muitas músicas no âmbito político, principalmente contra a ditadura militar que se instaurou no passado aqui no Brasil. O pedido de voto de Chico era o pedido de um homem que tem uma imagem de politizado e intelectual. Ou seja, usar Chico como cabo eleitoral era dar a garantia que não eram somente pessoas pouco instruídas que votavam em Dilma. 

Do outro lado Aécio Neves do PSDB, político de um partido que é taxado por muitos como um partido que governa para a burguesia. Partido que antecedeu o governo Lula, governo este aprovado pela grande maioria dos brasileiros. O PSDB ficou conhecido popularmente como o partido da estabilização monetária e econômica, por outro lado, também ficaram famosas as suas privatizações de empresas estatais. Só restava ao marketing do PSDB desmistificar essa imagem ruim e provar que poderia, sim, fazer um governo melhor que o do PT, inclusive mais popular.

Músicos como Zezé di Camargo, sua filha Wanessa Camargo, Jorge e Mateus, Sandra de Sá, Fagner, Inimigos da HP, Beto Guedes e Xandy do Aviões do Forró, ofereceram sua imagem para cantar e pedir votos para o candidato Aécio Neves. Fazendo uma análise rápida, o marketing político do candidato do PSDB tentou passar aos eleitores a imagem que o candidato Aécio tinha um compromisso com todas as regiões, inclusive com o nordeste, reduto da candidata petista. Por isso foi de grande utilidade as imagens de Xandy, Fagner e de cantores sertanejos (muito escutados na região). A imagem de Beto Guedes (ex-componente do Clube da Esquina) foi uma tentativa de fortificar votos em Minas Gerais, terra Natal do candidato e onde as pesquisas indicavam que Dilma estava à sua frente. Ao utilizar a imagem de cantores pertencentes a cultura popular em grande quantidade, Aécio buscou passar sua mensagem de união com as classes mais baixas, para tentar, assim, angariar votos dessas classes. 

No mais, as músicas de ambos os candidatos caíram na boca de seus eleitores e passaram, através de jargões pegajosos, ideais e motivos para se votar em cada um. Todos sabiam que "Agora é Aécio, o Brasil inteiro querendo mudar", jargão que transparecia a opção ao PT, um partido com acusações de corrupção antes e durante a campanha. Os eleitores do peesedebista, cantavam em coro "A força que o Brasil precisa... Aé aé aé Aécio", se referindo a Aécio como o homem que iria "recolocar o Brasil nos trilhos do crescimento", já que o candidato sempre afirmava que a economia brasileira ia mal. 

Do outro lado: "Dilma, coração valente, força brasileira para seguir em frente". Com esse jargão o PT pregava a continuação de um governo popular, com um olhar especial para os pobres, e alegava que o Brasil não podia andar para trás, já que "um possível governo tucano seria um retrocesso para o país". No final da campanha o PT lançou uma música que misturava ritmos, sensações e incluía literatura de cordel, uma representação de um governo que "defendia a união, um país para todos, sem preconceito, e que não abandona nenhuma região (com foco no nordeste)".

Essa é uma pequena análise que não foi feita de forma aprofundada, mas que serve para a informação e reflexão sobre uma corrida presidencial emocionante e que só foi decidida nos últimos momentos. Esta análise serve para que saibamos a importância do contexto musical em todo âmbito do marketing e também no âmbito político. São reflexões que compartilho com vocês de acordo com estudos e pensamentos críticos que faço. Agora, nos resta torcer para que Dilma Rousseff realize um ótimo governo e que faça nosso país crescer cada vez mais com mais oportunidades para todos.

Sou feliz por ser brasileiro!  

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

É assim lá na terra sertaneja...



É assim lá na terra sertaneja 
Bicho e gente sofrendo a mesma mágoa 
No olhar do vaqueiro sobra água 
Mas a bomba celeste não despeja 
Quem aboia e campeia não deseja 
Ver o gado com sede o ano inteiro 
Nem o gado quer ver seu companheiro 
Em um rio de lágrimas sufocado 
No sertão falta água para o gado, 
Porém sobra nos olhos do vaqueiro. 

(Raimundo Caetano - Poeta Repentista)

Falando musicalmente...



"Mas se eu digo: venha, você traz a lenha pro meu fogo acender..." 

(Lenha - zeca Baleiro)

Toquinho e Gil - Tarde em Itapuã

Nesse encontro antológico em 1989, o mestre do violão, Toquinho, interpreta "Tarde em Itapuã", música de sua autoria juntamente com o poetinha Vinicius de Morais. Ao lado do fantástico Gilberto Gil, Toquinho faz um verdadeiro show de "Dueto", com a cadência de voz e harmonia nos acordes dos violões, brindando e lembrando aos amantes da MPB que o tempo passa, mas o que é valioso da nossa boa música permanece!



sábado, 18 de outubro de 2014

Escritos de viagem



O tempo não cessa, assim como o movimento do mundo. Em meio a tantas viagens, viajo em pensamentos, pois isso é viver. Sempre acompanhado de uma boa música. Escrevo sobre viagens, já que redijo esse texto enquanto viajo e observo as belezas naturais das terras ainda não habitadas. Daqui a alguns anos a civilização vai ser insuportável, pois não vai cessar, com isso o mundo fica pequeno para a ganância humana. Entre o contraste do ar-condicionado do ônibus e o sol que queima lá fora, observo a desigualdade social que deve continuar a ser combatida. Em meio a toda confusão política que vivemos, penso na responsabilidade da(o) próximo presidente. Com todos esses debates nos perdemos no meio da complexidade que é administrar um país.

Através da janela me vejo e me identifico com o jeito de ser do povo, das casas, da vegetação, da determinação, da criação de animais... Sou nordestino com amor. Os pensamentos voam, sem fronteiras e limites, não imponho barreiras para eles. A dúvida nunca me abandona, dúvidas sobre a vida, mas ela sempre tem me respondido. Por isso aprendi a esperar. Anseio pelo futuro é perda de tempo. Segue a viagem, estrada passando pela janela e a música em volume cem. Penso que estou em casa, estou certo, o mundo é minha casa. Essa divisão e organização de fronteiras, casas, terras e terrenos, é só pra organizar mesmo, de fato (na unicidade do mundo) estou em casa.


Partir e voltar faz parte do ciclo da vida. Acredito que tudo é cíclico, tudo vai e tudo volta, mas não igual. Como diz a música: “nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia”. E como diz Belchior: “o novo sempre vem”! Essa é mais uma, com sua importância individual, mas outras viagens virão. Um brinde à vida!


segunda-feira, 13 de outubro de 2014

A velhice...



Como um Banco Central o tempo é 
Todo ano pra nós libera um lote 
Não aceita ninguém dando calote 
Nem fazendo empréstimo de má fé 
Classe média, elite ou a ralé 
Todos passam no crivo da sentença 
O pior reajuste o da doença 
A maior inflação a da saudade 
A velhice é um débito que a idade 
Pode até prorrogar, mas não dispensa. 

 (Nonato Costa)

Falando musicalmente...



"Eu quero a felicidade de uma criança e um quintal do tamanho da esperança. Bendito sejam meus filhos, vejam como é gostoso a gente viver..."

(João e Duvê - Maciel Melo)

Disparada - Jair Rodrigues e Paulinho Dáfilin

Nossa videoteca Melodias da Alma traz o grande e eterno Jair Rodrigues que antes de desencarnar para outro plano fez uma apresentação no Rio de Janeiro cantando "Disparada", de Geraldo Vandré e Théo de Barros, Jair, como sempre, interage com o publico com sua simplicidade e alma de menino. Apesar de ser uma música bastante conhecida, essa interpretação traz um brilho à parte: Paulo Dáfilin. O grande músico e instrumentista  mostra todo seu talento na viola de doze cordas realizando um momento raro e inesquecível da MPB.


terça-feira, 7 de outubro de 2014

No dia que eu tenho raiva...



"No dia que eu tenho raiva 
O vento sente um cansaço 
O dia perde a beleza 
A lua perde o espaço 
O sol transforma-se em gelo 
Cai de pedaço em pedaço.” 

 (Poeta - Pinto do Monteiro)

Falando musicalmente...


"É só pensar em você que muda o dia. Minha alegria dá pra ver, não dá pra esconder, nem quero pensar se é certo querer o que vou lhe dizer: um beijo seu e eu vou só pensar em você..." 

(Pensar em você -Chico Cesar)

Cassia Eller - Blues da piedade

Cassia Eller interpreta com maestria um clássico do grande Cazuza: "blues da Piedade". É como uma verdadeira viagem ouvir essa relíquia da musica popular brasileira!