terça-feira, 3 de março de 2015

O conto de madalena sobre o homem enraizado



Madalena era o nome da professora do ensino fundamental que costumava sempre contar as histórias sobre as mais variadas coisas existentes, e jamais existentes, neste mundo de meu Deus. Tinha sempre à sua volta uma plateia atenta e curiosa que não piscava até o acabar das suas histórias. Esse público, com faixa etária de 7 a 8 anos, era fascinado por ela. Mas em um determinado dia, o sol baixou sua luz, o mundo girou mais devagar e passou a se resumir ali, naquela pequena sala de aula com mesinhas coloridas e cartolinas na parede. É que o foco das crianças nunca fora tão grande em Madalena com seu conto sobre o homem que criou raiz.

Ela contava sobre um homem, morador de um lugar indefinido na terra, que passando tanto tempo sentado, sem sair do lugar e imóvel, começou a criar raiz. Tudo se inicia quando seus pés começaram a afundar no chão. Mas o homem estava tão desleixado e tão paralisado que não se deixou notar por aquilo que lhe acontecia.  Suas pernas ganhavam maiores comprimentos, sua pele esticava, seus ossos cresciam e cada vez mais seus pés se enraizavam naquele solo. Dali em diante estava estabelecido uma certa dependência deste pobre homem com a sua terra. Era da terra que ele tirava os nutrientes necessários para viver. A cada dia que passava, mais a terra o amava e mais ele amava a terra. 

A história ficou conhecida naquele lugar. Já era sabido por todos que, naquela cidade, havia um homem que criara raiz sentado em sua cadeira. Havia muitas versões sobre isso. Poetas afirmavam ser a personificação do patriotismo e nacionalismo, cientistas tentavam explicar a relação do solo com o organismo humano, e outros simplesmente diziam que era tudo conversa afiada, afinal isso era impossível de acontecer. Naquela altura, até mesmo o homem enraizado já tinha percebido o seu estado, e quando isso ocorreu, o seu espanto não foi maior que sua tristeza.

Isso se deu, pois, até ele perceber que estava enraizado, muitas pessoas passaram por ele. Algumas tentavam contar aquele segredo visível, outros só conversavam sobre assuntos diversos. Muitos, de curiosos ou colegas passageiros, passaram a ser fortes amigos dele. O homem também tinha se apaixonado. Ele caiu de amores por uma mulher que começou a cuidar dele naquele estado, já impossibilitado de sair da cadeira e ir para lugar qualquer. Ela estava lá todos os dias, muito atenciosa e amorosa, ganhou o coração do homem enraizado e pôde dar o dela para ele.

Mas com o tempo as coisas mudam. Pessoas que iam visitá-lo deixaram de ir, algumas por motivos pessoais, algumas porque foram embora daquela cidadezinha, outros porque tinham cansado de ir todos os dias. Aquele homem, preso ao solo através dos pés, a cada dia que passava temia mais seu futuro. O que seria dele? Todos poderiam ir embora, tinham grande independência em relação a vida, eram livres. Mas ele estava ali, prostrado em sua cadeira. E a mulher que ele amava, com toda a sua liberdade diante de si, iria permanecer ali com ele? 

Os mementos vividos pelo homem enraizado ao lado de todos que estiveram com ele naquele momento, estariam guardados para sempre em sua memória. Tudo que ele vivera de forma mais intensa, ali, sentado naquela cadeira, nunca iria sair do seu coração. Mas para que ele conseguisse alçar novos voos, ir adiante, ele precisaria romper aqueles fortes laços que lhe obrigavam a estar naquele mesmo lugar durante todos aqueles dias. O homem enraizado tinha o mundo aos seus pés, mas estava preso a ele. Se ele quisesse ser livre, ele teria que romper aquele enraizamento. Para isso, seria preciso: força, coragem, objetivo...

Madalena encerrou a história, mas as crianças permaneciam estáticas. Na verdade, elas esperavam o final. O que teria acontecido com aquele homem? Naquele silêncio, o barulho da imaginação das crianças soava alto! Algumas olhavam para os seus pés, como se confirmassem que não tivesse criado raiz durante a história. Apesar da espera, nenhuma criança chegou a perguntar a Madalena o que teria acontecido com aquele homem. Elas preferiram conversar entre si. 

Cada uma das crianças tinha um pensamento sobre o que de fato ocorreu ou sobre o que de fato fariam elas naquela situação... Madalena, cheia de orgulho e com sentimento de realização, entendeu que ela conseguira passar a moral da história. E que dali em diante, aquelas crianças se enraizariam de forma cuidadosa e inteligente.

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